16 junho, 2019

Sopro de vida...Sopro de morte


Corvos e pombos pousam nas pedras tumulares do jardim cujos bancos cobertos de musgo aguardam há muito o descanso dos amantes. Um demónio de pedra lança um olhar perverso ao anjo de mármore alvo, guardião de memórias em farrapos. Na sombra dos arbustos e das folhagens, perdem-se duas sombras em gozos e loucuras sensuais, no silêncio soturno daquele jardim de morte. Um aroma tenebroso paira no ar cerrado e quente. Debaixo da densa treva e das suas cintilações, caminha descalça e altiva. Os longos cabelos negros baloiçam escondendo as costas nuas que o veludo do vestido não cobre.
Segura vai embriagada de escuridão, carregada de dor e tristeza, um punhal na mão.
Nas veias o sangue pulsa forte, no peito a cadência dispara, acelerada. Frágil e bela prossegue imperturbável, tendo como cúmplice o feitiço da lua. Amo intensamente a palidez do seu semblante, a figura esbelta e recatada, o peito imaculado onde anseio repousar dos desgostos e dos gumes afiados. 
Pudesse eu deitá-la no mármore frio, tomá-la nos braços e devolver-lhe num beijo o sopro de vida quase extinto. Pudesse eu adormecer no seu regaço e abandonar-me para sempre com ela num abraço.


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