08 janeiro, 2019

Metamorfose


Depois de tanto tempo, não a reconheci. Tinha crescido . Havia como que um prolongamento artificial da pessoa que já tinha sido. Desde o discurso pejorativo, carregado de ironias e polissemias, até ao total despojo de sentimentos, tudo nela era mutação.

Não havia margem para dúvidas, tinha filtrado o coração. Deitara fora os pedaços de afeto, a saudade, o amor. Tudo aquilo lhe tinha parecido uma armadilha perigosa da qual tivera de se desfazer. Tudo se tinha tornado insuportável.

Exaustão ...Cansaço...Inquietação

A recusa obrigara a um disfarce, aos despojos e à opacidade.

A beleza natural dera lugar ao artifício, a fragilidade à frieza, a transparência à metamorfose de um corpo fechado.

Tinha-lhe passado a vontade de viver uma vida arrumada. Despira as certezas como quem despe um vestido num só movimento e o deixa cair no chão frio.

Era tão legítimo viver rodeada de bruma, num cenário de permanente mudez e quietude, quanto ansiar por uma euforia desmedida num ambiente bucólico.

Era só abrir a janela...

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