09 fevereiro, 2020

A excitação das freiras


O miúdo andava no infantário das freiras. Ele gostava e por afinidade eu gostava também, embora às vezes me lembrasse do trauma da catequese, sim, porque eu fiz a catequese das freiras, mas foi naqueles anos em que os meninos não gostam das meninas e era eu e mais onze e elas estavam sempre a cochichar e com risinhos. Foi um inferno, depois passou. Adiante...

Andavam há meses a ensaiar para uma festa, acho que era de Natal. O miúdo vinha e contava tudo. Andava contente, embora não fosse muito dessas confusões. Nisso saía ao pai que também não gostava de confusões.

No dia do espectáculo aquilo encheu-se de pais e mães, hoje seria mais confuso com mães e mães e pais e pais e isso. Desde a entrada que as freiras avisavam que havia uma surpresa. Freiras com surpresas só podiam ser doces (mas estávamos em Lisboa e não Odivelas) ou um terço rezado em grupo. Havia de ser giro, tudo ali entalado a rezar o terço, mas eu já traçara um plano. Se chegasse a isso, tínhamos que ir levantar a roupa que estava a ameaçar chuva. 

O tempo ia passando e ele eram criancinhas com flauta, rábulas do menino Jesus, coros de Natal, essas coisas que vocês sabem. O nosso rebento entrou num coro e fiquei muito orgulhoso pois ficou o tempo todo a olhar para o lado onde estava uma santinha. No final, fez três vénias e tiveram que o ir buscar. Puto do caraças, levou aquilo a sério. 

A freira chefe veio ao microfone dizer "vamos fazer um intervalo de quinze minutos e depois há de vir a surpresa". Andavam excitadas, notava-se. Tendo em conta que a média de idades era acima dos 55 a excitação cansava-nos, mas ficava-lhes bem.

Viemos do intervalo todos a falar da surpresa, o que seria, parecia um segredo bem guardado do Vaticano. No palco havia movimento. Trouxeram uns dos mais novitos e sentaram-nos no chão em semicírculo. Saíram, a expectativa cresceu e lá detrás dos panos, no seu passo meio errante, meio navegante, entrou o Jorge Palma e sentou-se no chão no meio dos putos a cantar o Postal dos Correios. Todos nós acompanhávamos com palmas e eu estava de coração derretido. 

O Palma portou-se bem, parece que o filho dele era colega do meu. Aplaudimos muito e os putos pequenitos acordaram do torpor e começaram a subir pelo Palma acima, que levou meia dúzia ás cavalitas. 

As freiras estavam radiantes e confesso que esta foi uma das mais surpreendentes surpresas da minha vida, ainda maior do que quando vi um unicórnio a voar, mas disso não tenho a certeza.

Bem hajam as freiras do Patronato e o grande Jorge Palma.




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