29 abril, 2019

Hoje ou amanhã ou nunca

Éramos putos da noite, não parávamos em casa. Ele era trabalho, dar uma volta, ir jantar e basar logo. Saíamos sem destino, quer dizer, que não fosse o café ou a cervejaria da esquina ou a gruta.

Mas isto pouco vem ao caso, vamos à história que é para isso que me pagam e esta até é bem triste. Se não fosse hoje, amanhã não a escrevia, nem nunca.

Eu e o puto R. passávamos à noite no meu antigo liceu, a meter conversa com as miúdas que lá andavam. Foi uma fase.

Havia uma que me partia a cabeça. Tinha um ar misterioso e só falava por monossílabos e às vezes dissílabos.  Lembro-me da franja quase a tapar os olhos, como se usava, e das pestanas também. Era um conjunto muito agradável para fazer olhinhos.

Ela era um flirt total, sorria mas não ria. Eu ia aumentando o nível de treta, pois estava a ficar para trás, que o puto R já andava com a amiga. Esta coisa dos pares dava sempre jeito, mas quando um se safava e o outro ficava apeado era uma treta.

Depois de muito penar, quase uma semana, estávamos os dois sentados numas escadas do pátio, eu na treta, canção do bandido e tal, e ela a pestanejar muito lentamente. Parecia que estava a dizer sim. Inclinei-me para a beijar e ela retraiu-se. Pensei que era acanhamento. Meio a brincar perguntei - Hoje não? Ela não respondeu. Continuei, já a fazer beicinho - Amanhã? E ela a rir pela primeira vez, na minha cara e da minha cara, soltou um impiedoso - Nunca!!!

Toma lá, vai apanhar Arroz Doce, tinhas a mania e foste gozado na maior. Fiquei lixado e desapareci dali algum tempo. Hoje lembro-me do muito que gostava dos dissílabos dela.

Devia ser aquela coisa das hormonas vocais.

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