19 dezembro, 2018

O Jardim dos Suicidas


Ao lado direito do Elevador da Glória está o Jardim de São Pedro de Alcântara, um dos miradouros mais celebrados da cidade, ponto de passagem obrigatório para turistas e curiosos. A Baixa Pombalina e as colinas orientais estendem-se ao olhar.


Num extremo do gradeamento que suporta o observante, encontramos umas escadinhas de pedra que nos conduzem ao patamar abaixo.  Acredite-se ou não, este local foi vazadouro de lixos e de animais mortos (!) nos anos que se seguiram ao grande terramoto. Só em 1835, depois de atulhado por iniciativa da Guarda Real da Polícia, devido ao cheiro nauseabundo que por aí pairava, se construiu o jardim, o qual encerra memórias trágicas e outras.

Das primeiras conta Luís Pastor de Macedo:

“(…) Mas ao passo que Lisboa desfrutava duma encantadora janela escancarada sobre si mesma e um jardim deliciosíssimo de copado arvoredo, dispunha também de um sítio esplêndido para a tentação dos suicidas. E essa aprazível e pitoresca varanda de parapeito de alvenaria com um metro de altura e com poiais de cantaria para que o visitante curioso pudesse sentar-se e gozar regaladamente o belo panorama, passou a ser procurada de maneira desenfreada por todos os desiluduidos que espectaculosamente queriam deixar este mundo.

E tantos foram ali os suicídios, tanto barulho se fez na Imprensa, tantos clamores subiram às esferas municipais, que a Câmara, já de posse da administração do jardim desde 1839, por resolução de 12 de Maio de 1864, mandou substituir o parapeito por uma grade, parte da qual pertencera ao antigo palácio da Inquisição. (...)”

De suicidas se fartava a futura Rua das Taipas e assim se explica o súbito arrepio, frio e pastoso, que percorre a espinha do desprevenido mictante, que depois de uma noite de folia no devassado Bairro Alto, desce ao jardim e sem vergonha aí se permite aliviar os seus fluidos.


Este texto completa-se com o "O Jardim dos Enamorados", que aparecerá por aqui noutro dia.

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