Pelas frestas a aragem era fria. Trabalhávamos em silêncio, encafuados nos papéis, com o aquecedor ligado para consolar os ossos e já a pensar no almoço.
Lá fora, uma chuvinha miudinha puxava o lustro às plantas e pequenas gotas escorriam pelas folhas, molhando a terra.
De repente, a chuva cresceu, e já não era chuva, era cascalho que caía do céu, grossas pedras de granizo como nunca se vira. Afogava as plantas, pisava-as e o barulho ensurdecia. Corremos às janelas, as bocas abertas de espanto e medo. Seria o Dilúvio, o final dos tempos?
Um estrondo enorme sobrepôs-se ao bombear do granizo. Assustados, olhamos-nos e a Fátinha deu um ai Jesus. Corri ao corredor e vi cabeças assustadas a assomarem. A saraivada continuava, apavorava.
Caiu o telhado, pensámos todos e subimos a escada quatro a quatro. A porta do sótão estava trancada e a barulheira era infernal. Chegou a chave e entrámos, a Lena à frente, como sempre, e o Mendes atrás, ofegante e apavorado.
Nada, aparte a chuva que baixava o tom, as telhas velhas estavam intactas. Foram espíritos, gemeu alguém.
Então, uma vozinha soou do baixo das escadas, era o Nando, venham ajudar-me, a estante das enciclopédias caiu e por pouco não me matava.
Coitado. Apetecia-me esganá-lo.
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