14 abril, 2020

Amor virtual

Não podendo ser de outra forma, resta-nos o amor virtual.
Beijos, abraços e afetos tornaram-se reféns de visores digitais onde cada um de nós dá o seu melhor para que do outro lado chegue o calor adiado.
Não poder tocar em quem amamos parece absurdo, mas é real.
Se em tempos atrás o ecrã não era muito amigo do amor, comprometendo-o por vezes até, é hoje um precioso aliado que nos permite perceber que a pessoa amada está do outro lado e que estamos juntos apesar da distância que nos separa. É de facto tudo mais asséptico, distante, mas é o que temos e com essa nova realidade reinventam-se afetos, consolidam-se amores, matam-se saudades.
O tempo que nos faltava é agora em demasia, nem sabemos o que fazer com ele. Apenas queremos que acelere , que nos dê uma resposta célere, que nos devolva a vida.
Temos tempo, muito tempo para pensar naqueles que amamos e nas coisas que vamos dizer quando o reencontro for possível, nos abraços e beijos em espera, no afeto muitas vezes contido.
Imaginamos reencontros perfeitos e idílicos ainda sabendo que com a ânsia  e a pressa do reencontro se concretizarão em transparência e espontaneidade, sem grandes preocupações mas com muita vontade de colmatar os dias perdidos na névoa da incerteza, de retomar as histórias de amor que ficaram suspensas em tempos de sombra.
Ontem sonhávamos. Hoje estamos atordoados. Todos ansiamos pelo fim do torpor e  pela plenitude da vida que há de voltar um dia.
Até lá resta-nos flutuar na quietude dos dias e esperar pelo tumulto da vida que nos há de arrebatar.

Fica a sugestão da audição de Into my arms de Nick Cave não necessariamente durante a leitura, mas quando o leitor assim o entender.


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